Esperava mais de uma mudança penal no Brasil.
Vivemos uma crise de violência, não vejo onde isso vá resolver alguma coisa. Diminuir pena de furto? Devem estar brincando, não é? Onde o País vai parar assim Matéria
G1:
A comissão de juristas composta para propor mudanças no Código Penal entregou nesta quarta-feira (27) o resultado do trabalho. As propostas serão analisadas pelo Senado como projeto de lei (Veja as principais propostas ao final). Para Maria Isabel Bermúdez, advogada especialista em direito criminal, as mudanças são "mais do que necessárias". "É um Código de 1940, precisa ser modernizado, mas não com base no clamor público, por penas mais graves. É uma ilusão. Só a lei rígida não basta. O aumento de pena por si só não vai diminuir o crime e não vai melhorar a segurança pública", afirma. Segundo ela, um dos problemas está em punir o chamado enriquecimento ilícito de funcionários públicos. “É temeroso que se comece a denunciar qualquer tipo de enriquecimento. O funcionário público que tem uma conduta inidônea já é punido pela lei de improbidade administrativa e já tem penas bem drásticas. O Código Penal já dá conta”, afirma. A criminalista elogia outras mudanças propostas, como a criação de penas para o jogo do bicho, organização criminosa, terrorismo, como também a previsão de aborto em caso de anencefalia. “Está bem completo, está se modernizando em diversas áreas”, avalia. Entre as mudanças está tornar crime a exploração de jogos, que está legislação brasileira como contravenção penal, com penas mais brandas que geralmente não levam à prisão. Os juristas também propõem punir de maneira mais rigorosa aqueles que utilizam menores de idade na prática de crimes.
Sobre a inserção dos chamados crimes cibernéticos, o advogado Jair Jaloreto, especialista em direito penal e em crimes na internet, avalia que nem todas as condutas precisariam de lei específica. "Furto de dados, por exemplo, já existe no Código Penal. É o crime de furto", afirma. Já para outros crimes na internet, as mudanças são necessárias. “Tem muita coisa que não é criminalizada. Se invado um site e tenho acesso a dados que lá estão, e saio, por exemplo. E isso não é difícil provar. Essa e outras condutas precisam ser criminalizadas”, avalia. O furto também passa a ser um crime de ação penal condicionada (alguém precisa fazer a queixa para que o autor seja acusado), com pena menor, de seis meses a três anos de reclusão. “Tem muita gente presa por esse crime. Essa mudança deve dar oportunidade para essas pessoas que são rés primárias e lotam os presídios”, afirma Bermúdez. Helena Regina Lobo da Costa, membro da Comissão de Direito Penal do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp), avalia que o trabalho da comissão “está sendo feito de forma meio açodada” e ainda há necessidade de uma revisão.
Para a especialista, os tipos penais criados precisam ter penas proporcionais, levando em conta o conjunto do Código Penal. “Cada proposta é lançada a conta gotas sem ter uma reflexão sobre como estabelecer um sistema coerente”, afirma. “A comissão fez propostas apressadas, muitas vezes baseadas em fatos específicos, um crime que teve uma repercussão maior na imprensa.” Um dos problemas, segundo ela, está no tipo penal que criminaliza o “bullying”. “Várias dessas condutas já são criminalizadas hoje como ameaça, lesão corporal. O que se teme é que além de tudo o novo Código traga problemas na hora de interpretar a lei. O que vou aplicar? Elas ignoram figuras que já existem”, afirma. A criminalista diz ainda que há um aumento exagerado das penas previstas. “O Brasil hoje já é o terceiro país no mundo que mais encarcera pessoas. Temos as prisões absolutamente lotadas. E isso já se viu que não funciona. Há propostas para se diminuir penas sim, mas realmente, são propostas isoladas. No todo, o que prevalece é a criação de novas figuras e o aumento de penas", completa.
Veja a seguir as principais mudanças propostas para o novo Código Penal:
Beber e dirigir: Digirir sob influência de álcool ou substância com efeito parecido pode ser considerado crime. Não precisa causar dano, expor ao risco é suficiente. Penas: 1 a 3 anos de prisão
Racha: Corrida, disputa ou competição automobilística em via pública não autorizada. Penas: 2 a 4 anos de prisão
Abandono de animal: Pena: prisão, de 6 meses a 2 anos, se do fato não resultar crime mais grave
Perturbação do sossego: Algazarra, gritaria, barulho e até um animal barulhento que o dono não procura impedir ou provoca a fazer barulho. Pena: prisão de 6 meses a 1 ano
Omissão de comunicação: Exercendo função pública, principalmente na medicina e na área sanitária, deixar de comunicar a uma autoridade um crime de ação pública (que o Ministério Público precisa denunciar). Pena: 1 a 2 anos de prisão
Funcionário público: Passar-se por funcionário público. Pena: prisão de 1 a 2 anos
Jogos ilegais: Explorar jogo de azar. Pena: 1 a 2 anos
Estupro: Especifica as maneiras de constrangimento: sexual vaginal, anal ou oral. Pena: 6 a 10 anos de reclusão. Manipulação e introdução sexual de objetos vaginal ou anal. Pena: 6 a 10 anos de reclusão. Molestamento sexual, se for diverso do estupro vaginal, anal e oral. Pena: 2 a 6 anos de reclusão
Estupro de vulnerável: Passa a ser contra menor de 12 anos, relação sexual vaginal, anal ou oral. Pena: 8 a 12 anos de reclusão.
Aborto: Três novas hipóteses em que não é crime:
- gravidez por emprego não consentido de técnica de reprodução assistida;
- anencefalia ou feto com graves e incuráveis anomalias, atestado por dois médicos;
- por vontade da gestante até a 12ª semana da gestação, quando o médico constatar que a mulher não apresenta condições psicológicas para a maternidade
Crimes cibernéticos
- Intrusão cibernética: acessar indevidamente ou sem autorização sistema protegido. Pena: de 6 meses a 1 ano de prisão ou multa
- Sabotagem informática: interferir de qualquer forma sem autorização contra a funcionalidade do sistema. Pena: de 1 a 2 anos de prisão e multa.
Furto: Diminui a pena e passa a ser obrigatória a queixa. Pena: 6 meses a 3 anos de reclusão
Idoso: Abandonar idoso em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência, ou congêneres, ou não prover suas necessidades básicas. Pena: 6 meses a 3 anos de prisão
Terrorismo: Causar terror na população com fim de forçar autoridades, financiar grupos armados, motivadas por preconceito de raça, cor, entre outros. Pena – 8 a 15 anos de prisão
Eventos esportivos ou culturais: Promover tumulto, praticar ou incitar a violência ou invadir local restrito aos competidores. Pena: 1 a 2 anos de prisão.
Progressão de regime: A progressão para um regime menos gravoso (semiaberto ou aberto) leva em conta o bom comportamento carcerário, e aumenta o tempo de pena a ser cumprido
Crimes de licitações: Dispensar ou inexigir licitação, fora das hipóteses previstas em lei. Pena: de 3 a 6 anos de prisão
Tráfico de drogas: Não há crime se a pessoa adquire, guarda, tem em depósito, transporta ou traz consigo drogas para consumo pessoal. Também se semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de drogas para consumo pessoal
Intimidação vexatória, o "bullying": Intimidar, constranger, ameaçar, assediar sexualmente, ofender, de forma intencional e reiterada, direta ou indiretamente, por qualquer meio, valendo-se de superioridade e causando sofrimento. Somente se a vítima representar. Pena: prisão de 1a 4 anos
Enriquecimento ilícito do servidor: Adquirir, vender, alugar, entre outros, valores ou bens móveis ou imóveis que sejam incompatíveis com os rendimentos. Pena: 1 a 5 anos de prisão.
Sérgio