sábado, julho 31, 2010

O Boeing 707

Pessoal,

Vou reproduzir abaixo uma matéria do Jetsite, portal de aviação do meu amigo e jornalista Gianfranco Betting. Ele, que hoje é diretor de marketing da Azul Linhas Aéreas, possui um grande conhecimento e amor pela aviação e faz um excelente trabalho de pesquisa histórica neste portal. Em paralelo a isso, tem publicado livros de valor histórico sobre a aviação no Brasil. A matéria que reproduzo é a primeira parte sobre o início da Era do Jato no Brasil e fala dos Caravelle e os primeiros dois Boeing 707 de nossa aviação, o PP-VJA e PP-VJB, que depois de acidentado, foi substituído pelo PP-VJJ. Para quem não tem essa paixão pela aviação, explico: para nós cada aeronave tem de ser estudada do ponto de vista de cada modelo e não apenas do modelo em si, ou seja, cada "unidade" e sua história contam. Por exemplo, no momento está em construção um Boeing 707 que representará o PP-VJA em minha coleção, aeronave histórica. Espero que gostem...

O Brasil na era do Jato

Em 2 de maio de 1952, entrou em operação o De Havilland Comet 1, primeiro jato comercial da história, inaugurando uma nova era na aviação. O quadrimotor colocou a Grã-Bretanha na dianteira entre os grandes construtores aeronáuticos mundiais. O esguio quadrimotor fez com que as três das grandes construtoras norte-americanas, Douglas, Boeing e Convair, corressem atrás do prejuízo, ou melhor, das pranchetas, em busca da liderança tecnológica perdida. A Boeing saiu na frente com o 707, seguido pela Douglas, que apresentaria seu quadrijato DC-8. Finalmente a Convair desenvolveu o modelo 880 e, posteriormente, o 990A.

Fiel à sua vocação de Pioneira, a Varig foi até os Estados Unidos e colocou, em setembro de 1957, o Brasil na era do jato. O presidente da Varig, Ruben Martin Berta assinou junto à Boeing a compra de dois Boeing 707-441, equipados com motores Rolls-Royce. Não satisfeito, depois Berta desembarcou em Toulouse, França, onde novamente foi às compras. Lá, a Sud Aviation havia lançado um bi-reator especificamente desenhado para vôos de trajetos médios e curtos, o SE-210 Caravelle. Em 16 de outubro de 1957 a Varig assinou o contrato de compra de dois Caravelle I, ao preço unitário de US$ 1.702.000,00. Dos três que a companhia eventualmente receberia, o primeiro, matriculado PP-VJC, chegou à base da companhia em Porto Alegre no começo da tarde de 24 de setembro de 1959.

Em 7 de dezembro de 1959, o Caravelle entrou em operação regular. Com a entrega da segunda aeronave (PP-VJD) em 12 de dezembro, havia condições de iniciar serviços a jato na linha para Nova York. Não que o Caravelle fosse uma aeronave projetada para vôos longos. Ao contrário, foi o primeiro jato desenhado especificamente para linhas curtas. Em 19 de dezembro de 1959, mais uma vez a Varig fez história: decolou o primeiro vôo RG 854, operado com Caravelle, entre Porto Alegre e Nova York. O vôo saía às 8h de Porto Alegre e chegava a Nova York às 21h do mesmo dia.

A despeito de seu sucesso nos serviços para os Estados Unidos, o Caravelle não fora encomendado para linhas intercontinentais. O equipamento deveria operar nas linhas-tronco domésticas e nos vôos para Buenos Aires e Montevidéu. O Caravelle estava sendo improvisado na linha para Nova York enquanto não ocorresse a entrega dos Boeing 707 originalmente encomendados para operar os vôos com destino à América do Norte. A Varig compensou dando um banho de luxo: Em sua configuração inicial, os Caravelle da Pioneira tinham apenas 48 poltronas do tipo "sleeperette" nos vôos para Nova York. O vôo era inicialmente Rio-Belém-Port of Spain-Nassau-Nova York, pois os jatos operavam com grande restrição de carga útil. Além disso, o serviço era exclusivamente de primeira classe.

No caso da versão do 707 encomendada pela Varig, aconteceu um imprevisto no desnvolvimento. Os Boeing 707 da Varig foram encomendados na versão 420, equipada com quatro motores Rolls-Royce Conway 508, os mais possantes disponíveis à época. O problema é que justamente esta versão, encomendada também pela empresa britânica BOAC, precisou de uma modificação nas suas superfícies de controle. Autoridades britânicas acreditavam que eram insuficientes as características de autoridade do leme de direção, em caso de perda de um ou mais motores, insuficientes para manter o jato sob controle em caso de pane. A solução foi aumentar a superfície da cauda, bem como instalar uma "barbatana ventral" próxima ao final da fuselagem. Essas modificações levaram a atrasos inevitáveis. O Boeing 707 teve de se contentar em chegar em segundo lugar na era do jato no Brasil. Pouco tempo depois, no entanto, suas características fariam dele sinônimo de modernidade, conforto, velocidade e segurança.

Chega o primeiro Boeing ao Brasil

O primeiro 707-441 (o sufixo "41" foi a designação reservada à Varig pela fabricante), seria também a primeira aeronave da Boeing, nova de fábrica, a ser entregue no Brasil. Depois dele, centenas de jatos Boeing seriam entregues à empresas brasileiras. Matriculado PP-VJA, saiu da linha de produção em 15 de fevereiro de 1960. Após passar por prolongados testes e modificações, foi finalmente entregue à Varig em 7 de junho de 1960. Coube ao comandante Nº1 da Varig, Geraldo Knippling, trazer o gigante entre Seattle e Nova York e desta, sem escalas, até Porto Alegre. Neste último trecho, um recorde foi estabelecido: 8.161 quilômetros voados non-stop em 09h33, mantendo uma velocidade média de 859 km/h. A segunda aeronave, PP-VJB, foi entregue pelo fabricante em 15 de junho de 1960.

Por seu tamanho, conforto e velocidade, o Boeing 707 converteu-se na estrela maior da companhia gaúcha. Apesar de poder acomodar mais de 150 ocupantes, recebeu configuração interna extremamente confortável: somente 48 assentos na primeira classe e sessenta na turista. Além disso, contava com nada menos que seis banheiros e mais um lavatório. Em 2 de julho de 1960, o PP-VJA voou pela primeira vez um vôo regular, sem escalas, na rota Rio-Nova York. Era simplesmente então a mais longa rota regular, sem escalas, na aviação mundial. Outro feito digno de monta na gloriosa história da Varig.

Os Boeing 707-441 da Varig operavam a rota para Nova York no limite de sua performance. Com tanques cheios ao máximo, muitas vezes era necessário sacrificar a capacidade de carga de porão. Desta forma, os vôos eram feitos sem escalas até Nova York. Isso tinha grande importância comercial. Os Boeing 707 usados pela Pan American, concorrente direta na rota, precisavam fazer uma escala em Port of Spain. Equipados com motores Pratt & Whitney JT4A, de maior consumo, os Boeings da PanAm não conseguiam operar entre Rio e Nova York non-stop. A Varig anunciava com grande destaque as operações sem escalas em ambos os sentidos. Vale lembrar que os Rolls-Royce Conway foram os primeiros motores "by-pass" operados no mundo. Eles reduziam ligeiramente o consumo do avião. Na verdade, foram os primeiros motores "turbofan" a entrar em operação, ainda que com baixa taxa de desvio, na casa de 0,2:1. De toda forma, essa pequena redução de consumo permitia à Varig voar sem escalas, ainda que com muitas restrições entre Rio e Nova York.

Em função disso, nesses vôos para Nova York, os 707 usavam praticamente toda a extensão da pista do Galeão. Álvaro Neto, que foi piloto de Boeing na Varig e hoje é diretor de operações na Azul, relembra algumas histórias magníficas que ouvia dos seus instrutores, veteranos comandantes dos 707 na Pioneira. "Essas velhas águias jamais esqueceram aquelas decolagens críticas, no peso máximo. Essas decolagens eram feitas nos limites máximos, exigindo, além de toda a potência dos jatos, muito sangue-frio e habilidade por parte dos pilotos."

Com a chegada do PP-VJB, um novo padrão de três vôos regulares semanais, sem escalas entre Rio e Nova York, teve início em 20 de julho. Os Caravelle voavam desde dezembro de 1959 duas vezes por semana de S. Paulo-Rio-Belém-Port of Spain-Nassau-Nova York. Mais tarde passou a operar também em Brasília. A Varig manteve após o inicio dos vôos com os 707, em 1960, 4 serviços semanais de Super Constellation para Nova York, dois com escala apenas em Port of Spain (operados somente com aviões com "wing tip tanks") e dois via Belém-Trujillo.

Os vôos com Boeing 707 em 1961 eram feitos três vezes por semana, duas vezes Rio-Nova York direto, e uma vez via Brasília e Port of Spain. A Varig manteve em 1961 dois serviços semanais de Super G de Porto Alegre a Nova York, via Rio-Belém-Port of Spain-Trujillo. O Caravelle passou em fins de 1960 a efetuar a rota Buenos Aires-Porto Alegre-S.Paulo-Rio (2 vezes por semana), Porto Alegre-Rio-Brasília (5 vezes por semana), POA-SAO-RIO-BSB- (2 vezes por semana) e POA-SAO-RIO (4 vezes por semana). O Caravelle não voava mais para Nova York após a chegada do segundo B 707, o PP-VJB. Esta mesma aeronave, em 19 de outubro de 1960, teve a honra de fazer o primeiro pouso em um novo aeroporto brasileiro: Viracopos (VCP), localizado em Campinas, estado de São Paulo. VCP foi construído como alternativa para permitir a operação dos grandes jatos que começavam a operar no Galeão e que não podiam operar nas curtas pistas de Congonhas.

Como o tráfego para Nova York não garantia o emprego dos dois Boeing 707, o PP-VJB foi arrendado à El Al por vários meses. Após a aquisição da Real em agosto de 1961, a Varig, que já havia recebido de volta o PP-VJB, inaugurou em 18 de novembro de 1961 a linha Rio-Lima-Bogotá-Cidade do México-Los Angeles, antes operada pelos Super H da Real.

E foi justamente em um desses serviços que, poucos meses depois, o VJB protagonizou a primeira tragédia da aviação a jato no Brasil. Na madrugada de 27 de novembro de 1962, a aeronave aproximava-se de Lima quando, minutos antes do pouso, acabou colidindo com uma montanha nas cercanias da capital peruana, infelizmente matando todos os 97 ocupantes. A aeronave tinha apenas 6.331 horas de vôo. Desprovida da capacidade do PP-VJB, a Varig encomendou outra aeronave idêntica para substituí-lo, o PP-VJJ. Entregue em 12 de novembro de 1963, permitiu à Varig retomar sua capacidade inicial na rota. Durante este período, os vôos para Nova York foram operados, em alguns dias - quem diria - pelos polivalentes Lockheed Electra, recebidos de uma encomenda originalmente feita pela própria Real.

Conheça mais da história do Boeing 707 no Brasil e muito mais visitando o Jetsite.

Sérgio

Um comentário:

Unknown disse...

Oi Sérgio!!
Quando fico com saudade do meu radinho eu passo por aqui!!
Abraço