Uma reunião de quase uma hora de duração selou o clima de guerra entre o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, e as associações de magistrados. Barbosa disse que a criação de novos Tribunais Regionais Federais (TRFs) foi aprovada de forma “sorrateira” com o apoio das associações e apostou que os tribunais serão construídos perto de praias. No encontro, Barbosa pediu para um dos representantes de juízes “abaixar o tom de voz” e só se manifestar quando ele autorizasse.
- Esses tribunais vão ser criados em resorts, em alguma grande praia! - disse, irônico.
Estavam presentes integrantes da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), da Associação de Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e da Associação Nacional da Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). Barbosa reclamou que o Congresso Nacional aprovou os novos tribunais sem ouvir órgãos interessados.
- Mais uma vez, se toma uma decisão de peso no país sem ouvir o CNJ. Ou seja, à base de cochichos. Os senadores e deputados foram induzidos a erro. Porque ninguém colocou nada no papel - disse.
Um dos juízes chegou a dizer que a Ajufe foi ouvida no processo, mas o ministro não gostou do comentário.
- A Constituição não dá poderes à Ajufe. Isso não faz parte das exigências constitucionais. Não confunda a legitimidade que o senhor tem enquanto representante sindical com a legitimidade dos órgãos do Estado. Eu estou dizendo é que órgãos importantes do Estado não se pronunciaram sobre o projeto. Pelo que eu vejo, vocês participaram de forma sorrateira na aprovação - afirmou.
O vice-presidente da Ajufe, Ivanir César Ireno, protestou:
- Sorrateira não, ministro. Sorrateira não. Democrática e transparente.
Barbosa ficou irritado com a intervenção.
- O senhor abaixe a voz que o senhor está na presidência do Supremo Tribunal Federal. Só me dirija a palavra quando eu lhe pedir - declarou.
E continuou:
- Como é que quase duplica o número de tribunais federais no Brasil dessa maneira? Os senhores não representam o Conselho Nacional de Justiça. Os senhores não representam o Superior Tribunal de Justiça, representam seus interesses corporativos legítimos. Mais isso não supre a vontade dos órgãos estatais. Compreendam isso. Os senhores não representam a nação. Não representam os órgãos estatais. Os senhores são representantes de classe. Só isso.
O ministro também pediu que as associações não fossem à imprensa para reclamar de sua gestão, mas que encaminhassem um ofício a ele. Recentemente, o ministro disse que os juízes brasileiros tinham uma mentalidade em prol da impunidade. Também declarou que havia um conluio entre juízes e advogados. As associações divulgaram notas criticando Barbosa.
- Olha, quando vocês tiverem algo para acrescentar e aprimorar, antes de ir à imprensa, vocês dirijam um documento à minha assessoria e ao CNJ. Não vá á imprensa para criar clima desfavorável.
O presidente da AMB, Nelson Calandra, protestou:
- Pedimos essa audiência em dezembro.
- Eu estou recebendo agora. Sou muito ocupado, não tenho tempo para receber associações todo dia.
Recebi esse senhor não tem quatro meses - rebateu Barbosa, apontando para o presidente da Ajufe, Nino Toldo. Quando Toldo informou seu nome ao presidente do STF, ouviu dele:
- Não tenho a obrigação de saber o seu nome, lembro da sua fisionomia.
O único momento de concordância foi quando as associações pediram apoio na reforma dos códigos brasileiros. Calandra reclamou que as comissões do Congresso criadas para discutir os temas não contam com a presença de juízes. Barbosa legitimou o pleito.
- Sou inteiramente favorável a uma total remodelagem dessas nossas leis arcaicas. Me preocupo muito com o desequilíbrio que ocorre nessas comissões. São convidados especialistas, mas não há preocupação em convidar magistrados e o Ministério Público. O resultado são essas leis capengas, que tornam nosso sistema de justiça mais tendentes à impunidade - disse o ministro.
Barbosa aproveitou para criticar a promoção de juízes por merecimento. Para ele, o sistema beneficia apenas quem tem apadrinhamento político e obriga o juiz a andar “com o pires na mão” para conseguir um novo posto.
Sérgio
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